De Morfeu a Sandman: O que a cultura popular nos ensina sobre o poder dos sonhos

Seja o enigmático e sombrio Morfeu da série Sandman da Netflix, ou o deus grego alado que lhe deu o nome, a nossa fascinação pelo mundo dos sonhos é tão antiga como a própria humanidade. Os sonhos sempre foram um enigma. Na antiguidade, eram vistos como mensagens diretas dos deuses, profecias sussurradas que podiam alterar o destino de impérios ou consolar um coração enlutado.
Mas o que têm em comum o Morfeu da mitologia, o Sandman do folclore nórdico que nos põe areia nos olhos, e até o nosso “João Pestana”?
Todos eles são personificações do mesmo poder: o poder transformador dos sonhos. Neste artigo, viajamos “de Morfeu a Sandman”, explorando como diferentes culturas (da Grécia Antiga aos povos indígenas da Amazónia), tentaram decifrar este mundo oculto. Vamos descobrir como esses mitos antigos não só sobreviveram, como evoluíram, influenciando a psicanálise de Freud e Jung e continuando a moldar a forma como a cultura popular nos ensina a olhar para dentro de nós mesmos.
A MITOLOGIA
Na mitologia grega, Morfeu é o deus dos sonhos, representado com asas que simbolizam a sua capacidade de viajar para o mundo dos sonhos e trazer mensagens para os humanos. Ele tem a habilidade de assumir qualquer forma humana e aparecer nos sonhos das pessoas na forma da pessoa amada.
Morfeu é filho de Hipnos (o deus do sono) e neto de Nix (a noite). Morfeu e os seus irmãos Ícelo e Fântaso, são considerados os Orneiros ou personificações dos sonhos. Ícelo, tem a capacidade de aparecer no reino dos mortais na forma de diversos animais e alterar a sua forma física para interagir com os mortais neste mundo, já Fântaso aparece nos sonhos na forma de objetos inanimados ou “sem vida”.
Na mitologia romana, adaptou a mitologia grega e para eles Hipnos era Somnus, e os seus filhos eram Morfeu, Fântaso e Fobetor. Os romanos ofereciam sacrifícios e orações a Somnus para garantir um sono reparador. Embora esses rituais fossem frequentemente privados, eles refletiam a importância que os romanos atribuíam ao sono e seu respeito por Somnus, o deus que o governava.
Os romanos tinham os sonhos em alta conta e consideravam-nos um fenómeno sagrado. Acreditavam que os sonhos podiam trazer presságios e avisos, e frequentemente consultavam intérpretes de sonhos para entender os seus significados.
Na mitologia egípcia, os sonhadores eram vistos como guias no mundo espiritual, auxiliando as almas e guiando os vivos. Isto sugere que os sonhos eram vistos como uma forma de ligar os mundos físico e metafísico, muitas vezes interpretados como uma janela para o cosmos e um meio de obter cura ou orientação.
Por vezes, as pessoas iam a templos, como o de Hathor em Dendera, para praticar a incubação de sonhos, de modo a receberem curas milagrosas e conselhos dos deuses quando os médicos falhavam. O templo funerário de Hatchepsut em Deir el-Bahari e o templo de Seti I em Abidos também eram locais associados a curas e intervenções divinas através dos sonhos.
A TRADIÇÃO NÓRDICA
Na tradição nórdica, Njorun é mencionada como uma deusa dos sonhos, embora seja uma figura obscura e raramente descrita. Outras figuras relacionadas ao sono e aos pesadelos incluem Mara/Mare, uma entidade que causa pesadelos, e o Sandman (Homem de Areia), uma figura folclórica escandinava que simboliza o sono, conhecida por espalhar areia mágica nos olhos das crianças para as fazer adormecer e ter bons sonhos. A remela é associada à sua ação na noite anterior.
OS POVOS INDÍGENAS
Na mitologia aborígene, existe o “Tempo dos Sonhos”, que é um estado espiritual que se sobrepõe ao mundo físico, considerado a origem da vida e da criação através dos sonhos de um Grande Espírito.
Para os ameríndios, os sonhos são entendidos como um portal para outras realidades e uma forma de obter conhecimento e orientação, muitas vezes vindo de outros seres, como espíritos, ancestrais ou deuses. Os sonhos, não são considerados apenas uma viagem interior, mas sim um movimento “para fora” do mundo desperto, onde ocorrem interações significativas, como a caça, o encontro com os mortos e a cura.
Os Yanomami, um povo indígena que vive na floresta amazónica, considera que o sonho é o momento de encontro com os mortos. Na cosmologia Yanomami, a “Mari hi” (árvore dos sonhos) é fundamental para a vida e a sabedoria do povo, pois ela preserva os sonhos e as memórias, especialmente num mundo onde os sentidos podem ser afetados.
O FOLCLORE INFANTIL
O João Pestana, é uma figura mítica que simboliza o sono, um ser que chega silenciosamente, na ponta dos pés, para salpicar as pálpebras das crianças com um pó mágico para adormecerem. Quando o João Pestana chega ao quarto das crianças, acontece algo incrível e como que por magia, os olhos das crianças fecham-se e adormecem. Depois dormem toda a noite um sono tranquilo, sem medos e têm sonhos maravilhosos
A Fada dos Sonhos é uma figura mágica popular em histórias infantis que ajuda as crianças a dormir e a ter sonhos bonitos. Ela é descrita como uma criatura com asas brilhantes e uma varinha, que viaja pelo mundo dos sonhos para inspirar aventuras incríveis. A sua presença incentiva o descanso adequado, necessário para o crescimento e o desenvolvimento da imaginação das crianças.
COMO A MITOLOGIA INFLUENCIOU FREUD E JUNG
Sigmund Freud, o pai da psicanálise, utilizava frequentemente a mitologia nas suas teorias e escritos sobre a interpretação dos sonhos. Ele refere-se a Somnus e a sua capacidade de enviar sonhos aos mortais e ao conceito de sonhos como um portal para o subconsciente, uma ideia central na psicanálise, refletindo assim a antiga crença romana nos sonhos como mensagens divinas. Dessa forma, a figura de Somnus deixou uma marca duradoura na nossa compreensão contemporânea dos sonhos e o seu significado.
Para Carl Jung, a mitologia e os sonhos estão intrinsecamente ligados: os sonhos são “mensageiros” da psique, muitas vezes contendo símbolos e narrativas arquetípicas que ecoam a mitologia universal. A análise dos sonhos é crucial para a individuação, pois ajuda a integrar o inconsciente consciente, trazendo equilíbrio e significado à vida através da exploração desses conteúdos simbólicos.
Carl Jung deu grande importância à análise dos sonhos no processo de psicoterapia, transformando numa ferramenta essencial no processo de autoconhecimento.
Explorámos os deuses, os mitos e as figuras folclóricas que a humanidade criou para dar sentido ao poder dos sonhos. Vimos como, de Morfeu a Sandman, sempre soubemos que o mundo onírico tem o poder de nos transformar.
Mas e os teus sonhos?
Agora que entendes o poder que as culturas sempre lhes deram, está na hora de aprender a usar esse poder na tua própria vida. Os teus sonhos têm um “Lado Sombra” e um “Lado Luz”, e ambos são ferramentas cruciais para o teu crescimento e motivação.
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Fontes de informação: ler.letras.up.pt | norse-mythology.org | portal-dos-mitos.blogspot.com | mitologiaclasica.com | institutofreedom.com.br